Para trabalhar noção de começo/meio e fim as turmas serão dividas em grupo e serão distribuídos envelopes com a memória literária recortadas, no qual, os grupos montarão e em seguida socializarão, e os outros compararão com as suas produções expondo suas opiniões. No final, todos ouvirão a narração original, avaliando quem mais se aproximou.
Seguem os trechos recortados:
Naquele tempo, quando chovia, o valetão da Rua Sete de Setembro era
nosso mundo fantástico. Além das divertidas brincadeiras no lamaçal que
escorria da rua, fazíamos cabanas no paredão da erosão, guerrilhas com bodoque,
usando sementes de árvores como cinamomo e mamona.
Quando não chovia, sobrava tempo para
brincar só aos domingos. Então, eu - Pajé - e minha turma nos reuníamos na
mata, que se misturava com o terreiro das casas.
Nele, construíamos cabanas, arcos, flechas,
tacapes. Pintávamos o corpo todo com barro e frutinhas da mata. Assim,
sentindo-nos como heróis, brincávamos de índios guerreiros, até o sol se esconder.
Nossa
vida se enchia dos poderes que vinham da mata e seguia solta, como passarinho.
O fim da história? Não sei não, porque eu ainda vivo. E enquanto eu viver as
lembranças nunca vão terminar.
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Naquele tempo, uma
clareira; hoje, Rua Sete de Setembro. Essa rua foi crescendo e acolhendo o
progresso que tenta esconder e aprisionar as histórias de Pajé. Elas estão
descansando embaixo do calçamento, dos asfaltos, dos prédios, das casas. Basta
um sinal que elas voltam.
Cheiro de terra molhada - esse era o sinal. E,
ainda hoje, sinto esse cheiro entrando no meu cérebro e mexendo com o meu coração.
Naquele tempo bastava sentir o cheiro de terra molhada para que nós, os meninos
engraxates, escondêssemos nossas engraxadeiras - caixa de madeira em que se
guardava o material necessário para engraxar sapatos - no porão dos fundos da
bodega do Pizetta e, como garotos matreiros, saíssemos de mansinho, sem
despertar curiosidade. Corríamos lá embaixo, no começo da rua que embicava no
meio da mata, pois o mistério ia começar!
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O valetão que engolia meninos e outras histórias
de Pajé
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Já foram escritas muitas histórias da época
em que os meninos engraxates eram engolidos pelo valetão da Rua Sete de
Setembro. Mas nenhuma delas conta esta ou outras histórias de Pajé. Guardo-as
dentro do peito, como boas lembranças da rua onde vivi e que teimam em se
misturar com a história da cidade.
Nascemos
juntos: eu, a rua e essas histórias. Somos uma coisa só, mas nós não estamos
nos livros. Estamos na contramão, por isso me atrapalho com as palavras. Às
vezes falta ar, outras o ar é demais, então o meu coração acelera, o nó na
garganta avisa: o menino Pajé vai acordar!
Hoje, quem não
conhece a Rua Sete de Setembro é porque não conhece minha cidade - Toledo.
Apertada entre outras no extremo oeste paranaense, bem pertinho do Paraguai,
surgiu de uma clareira no meio da mata.
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A
chuva caía e formava muita enxurrada que, com sua força, trazia a terra
misturada. Parecia uma cascata de chocolate que despencava no valetão - buraco
muito profundo provocado pelas enxurradas, erosão. A água fresquinha que caía
do céu misturava com a terra quente e provocava o mistério. Nós éramos puxados
para dentro daquele enorme buraco por uma força estranha sem dó. Mesmo os que não
queriam não conseguiam resistir, porque a magia era muito forte e, em poucos
segundos, estávamos lá dentro, na garganta do valetão, onde brincávamos durante
horas. Nessas horas o trabalho era esquecido.
Quando eu era menino, trabalhava muito. Todos os
dias de manhã ia à escola e, ao retornar, mal acabava de almoçar, pegava a
engraxadeira, colocava nas costas para a rua, quer dizer, para o trabalho. A
engraxadeira era muito grande e pesada para meu tamanho - eu era apenas um
garoto! Mas era a única forma de ajudar minha mãe no sustento da família.
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Sentia como se estivesse carregando o mundo
sozinho.
Hoje sou adulto
e sei que aquela magia era fruto de nossa fantástica imaginação. Como qualquer
outro menino, o engraxate também tinha direito de brincar. Uma das poucas vezes
em que podíamos fazer isso era quando chovia. Mesmo que depois nos custasse
castigos e surras.
Atualmente, as
brincadeiras, comparadas com as de meu tempo, são muito diferentes. Hoje, os
heróis são Superman, Batman, Homem-Aranha. Antes tínhamos heróis indígenas, com
suas histórias cheias de mistérios das florestas.
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Fonte: Caderno do professor das Olimpíadas de Língua Portuguesa.
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